segunda-feira, 31 de julho de 2023

Transposição

 

Ah! Meu traumatismo craniano

que ninguém via, mas em mim doía.

Ninguém sentia enquanto eu sangrava

vagando pelos corredores sem rumo,

com mapas em sonhos, mas sem destino leve.

 

Que desejo obsoleto em conhecer a cidade.

Ah! Quem diria que meus passos levariam

anos até saírem do lugar?

 

E que liberdade era essa que eu via na Tv cultura

comendo biscoito, mas em mim não batia nada,

além dos insultos contra minha geração e em pró da ditadura?

 

Gritando calada, suportando o peso da maçaneta

que trancava minha alma e meu ser nas luzes brancas

e doloridas das quatro paredes que zombavam de mim?

 

E então fugi para o conforto das luzes amarelas,

margaridas, sol, ouro com dourado,

quebrei as portas e janelas sem violência,

protegi minha pele sem me esconder,

vagando em liberdade plena

pelas ruas desconhecidas,

tomando sorvete

com o amor da minha vida. 


quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Don't grabbed me. It's the end of an era.

 

E as alças que tanto amarravam, finalmente, arrebentaram deixando marcas físicas. Dessa vez não houve dúvidas sobre tantas cicatrizes no círculo de uma alma. Não há tempo suficiente para vivenciar todos os anos violentos que foram cravados no fundo daquele casco de navio, cheio de buracos. 


A maré comporta-se diferente durante a tempestade, contudo, os turistas não tinham do que reclamar, ali a maré era apenas um lago patético envelhecido pelos anos que se passaram.


Mas as máscaras de lagoas não duram tanto tempo, e, aos poucos, o que nos é oferecido por décadas de refeições mal digeridas acaba virando exibição em um menu público. Todos podem ler as receitas perversas que, enfiadas goela abaixo, ainda existem nas paredes do estômago dos injustiçados. 


Na brutalidade de tubos pálidos, onde apertado, não havia como buscar a vida pelo elemento essencial, estourou-se o botão do medo, apertou-se a alavanca da coragem, e não havia como errar, não há maneiras de retroceder aos impactos que a vida bruta causou. O solo de folhagens secas se ilumina a cada passo dado.



Longe, longe, longe.


Onde é que será, longe o suficiente, para que os canos jamais sejam lesados? Consumados pela tristeza, bestificados pela ausência de outras vidas tão dependentes, paredes de proteção não permitem a entrada indesejada do mofo que há lá fora. 


Estás bem capitã? Quantas rotas daqui até seus sonhos?

Passagem para dois. 

domingo, 1 de março de 2020

They blame me


Então eles me culpam por não expressar tristeza.
Eles me culpam por não haver pranto, tensão facial
ou mesmo desespero.

A ausência de melancolia em momentos exigidos,
como se o corpo humano fosse uma máquina
onde há uma torneira para ser ligada quando a sociedade exige.

Onde estavam os apontadores, os moralistas e os cidadãos
quando a torneira transbordou e afogou o navio que tentava
permanecer na superfície das obrigações com tantos furos em seu casco?

O quarto cheio de opiniões ofensivas, discursos camuflados, imitando
anúncios de tragédias ocorridas durante a história da humanidade,
tão corriqueiro o mal dentro de tantos, mas quem irá dizer a eles?

O silêncio é a ausência de som, mas é também a presença de palavras,
palavras que não são ditas para o porto não os expulsar, mas quem garante 
que diante de tantas cobranças um dia as alças não irão arrebentar?

As pontes cairão, destruídas pelo cinismo grotesco daqueles que desejam
a morte de tantos, mas te apontam quando a morte deles não te afeta.
E no fundo, todos nós sabemos, que destino ninguém muda e não há 
pranto neste mundo que vá alterar os braços escuros da morte.   

segunda-feira, 15 de julho de 2019

Chamas no Centro Oeste


Nesse diálogo noturno
expomos nossa opinião enquanto podemos
ainda somos livres ou é só um delírio vazio
no rodapé da constituição?

Querem acabar com os dizeres da revolução,
liberté, egalité, fraternité
mera ameaça que me faz te convidar,
assim, como se fôssemos jantar fora.
Ei, babe
Vamos queimar o congresso nacional
e nos beijar diante das chamas de Brasília?

Aqui não é paris e não tem torre eiffel
mas nossa classe é firme, sem luzes a meia noite
aqui só faíscam nossos olhares quando o teto que sustenta
a bandeira nacional desmorona e as cinzas da censura somem
como se nunca tivessem existido.

sexta-feira, 13 de abril de 2018

I am wild because i don't want to read today


A data de lançamento era no dia 22 de fevereiro de 2008, o pior ano da minha vida. Entretanto, os acontecimentos que me levaram ao fundo do poço ainda não tinham ocorrido, portanto, era uma data como outra qualquer. Por essa razão não prestei atenção, ainda era muito jovem e não havia despertado dentro de mim o platonismo e tamanha obsessão pelo cinema. É por isso que temos um lapso de três ou quatro anos após a estréia. Digo mais ou menos porque ainda não me recordo, embora muito tente, se o vi em 2011 ou 2012, mas lembro bem que estava no ensino médio, com aquela tensão de pré vestibular que parecia o fim do mundo. Naquele momento, realmente era o fim do mundo já que eu não me sentia boa o suficiente para fazer uma faculdade, a cabeça ainda fazia mil perguntas sobre os acontecimentos que travaram quem eu me tornei hoje somado as reprovações em matérias contendo cálculos absurdos. Isso não mudou, eles continuam absurdos e nunca deixarão de ser. A questão coincidiu com o roteiro, já que eu só começaria a estudar para entrar na faculdade mais para o meio do ano, então no primeiro semestre daquele ano incerto para sempre, eu dediquei o meu tempo a assistir filmes. 


Baixava todos os dias filmes com posteres que eu achava bonito, história interessante, sinopse envolvente. Foi então que eu vi um cara meio magrelo sentado em cima de um ônibus azul. O título traduzido "na natureza selvagem" me pareceu algum documentário do discovery, mas era muito mais que isso. O Into the Wild foi um filme que eu vi e não me impactei até o final, claro, o cara morrer por ter ingerido uma planta venenosa me parecia algo absurdo demais até saber que o filme foi baseado em fatos reais, que o cara existiu, que o ônibus ainda tá lá (embora o filme não tenha sido rodado lá e sim em uma réplica por questões de respeito e história em conservar o bem patrimonial cultural por assim dizer) e que fugir do mundo foi o ideal de alguém. 

Na hora pensei: "mas que absurdo", como quem estava desiludida por terem falado tanto daquele filme e não ter me impactado, mas hoje, quase seis anos depois de ter visto o filme eu entendo perfeitamente.  Não no sentido de querer a mesma trajetória e o mesmo fim, mas no sentido de fugir de forma não literal. E por incrível que pareça, eu diria literal pela leitura. Fugir das manchetes, das notícias do mundo, fugir dos conflitos travados, fugir da política atual, fugir da intolerância com qualquer coisa que seja contrária ao que as pessoas acham correto. É, fugir.

O mesmo verbo que para mim, aquele filme retratava de forma absurda. Mas veja bem, fugir do jornal hoje é mais relaxante que qualquer ilícito que você, caro leitor, ouse a usar em sua vida.
Perdi a conta de quantas vezes fui questionada sobre algum acontecimento. "Você viu isso?", "Você acha que vão deixar?", "Tá rolando a maior treta em tal lugar, você viu?"

E a minha resposta, inúmeras vezes foi a mesma: "Cara, não vi."

Quando eu estava no ensino médio os professores berraram com seus pulmões inundados de giz de lousa verde infantil e odor de canetão permanente em quadro branco: "Leiam jornal"

A desculpa era que a gente precisava ler jornal para saber o que estava acontecendo no mundo e consequentemente, o que o enem iria pedir em sua redação, quais temas provavelmente seriam solicitados nos vestibulares.

Leiam para entrar na faculdade.

Engraçado, hoje temos que NÃO LER para SAIR da faculdade.

Meus colegas de curso não sentem o cheiro de um livro de literatura há anos, não conseguem mais escrever ou fazer alguma coisa que lhes dê prazer. Não podemos passar horas lendo o jornal e as manchetes da época do enem porque aquilo é distração, não é doutrina, não é livro técnico, então consequentemente, não serve. 


A real razão da menção do into the wild é que não tenho vontade de ler as manchetes atuais e nem os livros técnicos. Tenho vontade de fugir dos jornais como fugiu o personagem do filme, queria poder ler apenas o que me desse prazer, seja livros de literatura ou notícias favoráveis a libertação animal plena. Mas não quero ler o que eu tinha que saber antigamente. 



"Não, eu não vi a notícia de hoje."

"E quer saber?"

"Eu adorei não ler nada hoje porque eu estou into the wild. "

segunda-feira, 29 de maio de 2017

Make me care again.

Não é preciso mencionar o nosso atual cenário político. Tampouco a guerra na Síria. É triste? É. É lamentável? É. Mas eu não consigo me importar com nada disso. Exatamente, nada. 

Eu não me importo se bilhões nos foram roubados ou se as pessoas estão se matando com uma AK 47 só para se entreterem no final de semana. Me culpo por não me importar, mas aparentemente é um sintoma patológico. Não me importo com o exterior, com o interior, com nada. Eu ouço os problemas das pessoas e tento me afligir, tento  de todas as maneiras buscar palavras de conforto. Quando as encontro, elas saem vazias feito vento, preenchidas como um saco de papelão estourado que alguém insiste em assoprar e assoprar. Tudo o que eu me importo é com dor. Com a dor que eu sinto no meu interior, com a dor de lutar contra mim mesma em não ceder aos meus impulsos. Eu não me importo. E eu deveria me importar muito. Ainda tem uma coisa ou outra que chama minha atenção e me faz me importar, mas essas coisas não são suficientes para que eu me agarre nelas e comece a me importar com o resto. Eu realmente não acho que isso seja normal, eu não sei exatamente por quanto tempo ficarei assim. Faz meses que não vejo jornal, não acesso G1. E quando acesso algum site de notícias, eu vejo um monte de coisa e não sinto nada. Teve aquele ataque terrorista recente em Manchester. Só fiquei sabendo porque vi um post no facebook sobre a rainha Elizabeth estar prestando solidariedade às vitimas no hospital. É isso, uma senhora de noventa e um anos se importando. E eu aqui, com vinte e dois não me importando, não sentindo, bloqueada com o que eu não sei. Por que será que o cotidiano não me comove mais? Será que eu me acostumei com o fato do homem ser mal e Thomas Hobbes tinha razão quando disse que o homem era o lobo do homem?

Mas se o fato for esse, para onde eu devo ir? Porque o mundo é cercado de homens, humanos, pessoas que destroem as coisas. Para onde eu vou com esse comportamento? Eu devo prosseguir como into the wild e morrer envenenada num ônibus azul ou eu continuo aqui não me importando com nada até que um dia, como num passe de magia, eu vá para a terra de Oz e meu único pedido para ele seja que eu me importe de novo? Profundamente, desesperadamente, suplicante e de joelhos: Me faça importar!. 

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Chapter eight

Se eu tentasse olhar para o céu nesse momento procurando por estrelas, eu não conseguiria sequer achar uma, pois o céu está nublado com a chuva da madrugada. Por essa razão, digamos que em uma situação hipotética eu conseguisse me deparar com um bonito e estrelado repleto de pontos brilhantes do passado. Eu encontraria os oito pontos mais brilhantes, porque hoje faz oito anos que você viajou sem se despedir.

A sua ausência me ensinou muitas coisas, acredite, sobreviver sem ter sua companhia ao meu lado não foi e não é a melhor coisa que eu faço, mas executo essa tarefa em piloto automático porque não tenho escolha. Você que sempre me ensinou tantas coisas desde pequena porque essa era a sua profissão, deixou algumas folhas do livro da vida em branco, onde eu levei o dever do aprendizado para casa e tive que fazer sozinha, torcendo para que estivesse tudo certo, pois você não iria corrigir uma linha sequer do que eu fizesse. Não mais.

Você deixou em branco alguns capítulos que para uma adolescente como eu na época de sua ausência, eram importantes. Não completamos o que planejávamos desde meus dez anos, a tal festa dos quinze. Não tivemos o brilho e o riso uma da outra quando eu te contasse sobre a experiência esquisita de um beijo todo errado. Você não me ensinou a como levantar de uma decepção amorosa. Sequer esteve presente no meu álbum de formatura da oitava série. Talvez esse capítulo tenha doído mais, é verdade.


Não houve riso seu ao me ver descontrolada na época do vestibular, tampouco ouvi suas preces para que alguma faculdade me aceitasse. Não me pintei de tinta com meus colegas durante um trote porque você não estaria em casa para gritar comigo por toda aquela tinta em cima de mim, não houve mais velas onde você me ajudaria a apagar.


Não houve tempo para você me ensinar a superar minhas notas baixas na faculdade ou mesmo a tentar entender meus professores quando eles não conseguiam me ensinar como você fazia, mas é que realmente não há como alguém me ensinar algo como você ensinava.


Você não me ensinou a me abrir com meus amigos, muitos sequer sabem da sua partida na minha vida, que sim, foi tão repentina. Outros não sabem da insônia que anda ao meu lado ou dos problemas que hoje marcam um braço cansado de apanhar. Eu ainda não aprendi esse capítulo, espero que não esteja muito apreensiva, mas é minha essência. O fechado e trancado para que outros capítulos não se dispersem sem terem sido estudados.


Mas talvez um dia eu abra a porta e deixe que as lições voem se elas quiserem, porque de todos os capítulos dessa doutrina que leio há vinte e dois anos, oito deles sem você, eu perdi o mais importante, o que torna os outros triviais e sem muito sentido.


Algumas linhas tinham que ser escritas porque as memórias estão ficando cada vez mais vazias e opacas. Me pergunto se aqueles dias de glória foram reais ou se toda a felicidade em tantos momentos realmente eram a simbologia mais doce e real da vida que eu um dia tive ao seu lado.