sábado, 29 de junho de 2013

Take this DNA out

Ele havia deixado que sua mente andasse adiante, quando a realidade é que a sua idade havia parado no caminho. O triste fato é que uma nunca mais encontraria a outra, pois quanto mais a idade avança, mais a sua mente corre contra o caminho da imaturidade.

Diariamente suas mãos iam de encontro com a expressão de seu rosto, deformando-o, ao escorrer com dedos fortes em pressão, dos olhos até o pescoço. Numa tentativa frustrada de arrancar os próprios olhos porque não queria ver e de se sufocar no pescoço em um nó imaginário porque não queria mais viver.
O DNA podre havia pulado o seu organismo, infelicidade ou não, ele poderia sair para beber se todos fossem massacrados como num filme de terror em um cenário sujo do Texas.

Seu pai sabia como ser surpreendentemente cruel, embora pensasse que o conhecia e que todas as maldades já haviam sido feitas, ele conseguia se superar em determinado momento com novas humilhações ou outros desaforos.
Sua garganta era como um pantanal, engolia anfíbios a todo instante sem deixá-los escapar. Às vezes, diante do espelho, folheava um dicionário velho (e tão miserável quanto sua existência) a procura de palavras que pudessem descrever o que sentia. E a cada palavra encontrada, ela era riscada.
Certo dia, não pode mais encontrar palavras, metade de um dicionário riscado é inútil. E mesmo que os rabiscos sejam feitos a lápis, o papel não volta a ser o mesmo após as carícias de uma borracha da terceira série que nunca terminava.

Nas noites andava em círculos em seu quarto, ou então se deitava no chão porque a cama era o lugar mais correto para dormir. E de lugares corretos, estava farto.
Na cozinha, com os pés sobre o corredor frio, abriu a gaveta e contemplou o seu reflexo em uma faca de cabo comprido. O reflexo de si mesmo implorava por um banho de hemoglobina própria, era tentador.
Atirar a faca contra o próprio peito teriam vários significados. Cessaria as contrações cardíacas involuntárias, um meio de mandar na própria vida.
Por mais dor que sentisse a todo instante, a dor física não o deixou satisfeito. Nem na possibilidade de pensar que poderia sobreviver, e a dor de relatar o que o motivou a fazer aquilo o irritava.

Não queria dar mais explicações do que fazia, quem encontrava, com quem sonhava, quantas vezes espirrava.
Se fosse internado em uma clínica com o diagnóstico de insanidade, seria o fato mais cômico de sua vida. Ele era a lucidez na casa dos loucos e desalmados. Se tinha motivos para ficar preso em um lugar longe de tudo aquilo, não era por falta de lucidez, mas sim pelo excesso da mesma.

A porta que o felicitava com a sacada parecia como o paraíso. As luzes dos prédios altos faziam-no imaginar pessoas inexistentes, residentes de suas fantasias alucinógenas.
O simples fato de tentar tocar as suas fantasias foi o combustível que precisava. Ele não tinha uma arma para usar contra si mesmo, o que precisava era transformar o próprio corpo em uma.


Que utilidade teria seu esqueleto além de sustentar músculos, tecidos e cartilagem? A queda parcial pôde dizer quando ele se jogou.


segunda-feira, 24 de junho de 2013

Royalty

Nessa chuva tão latente eu vejo as moças correrem.
Elas estão preocupadas em voltar do horário de almoço
para o trabalho com o cabelo bagunçado, da maneira natural
que ele é sem adereços térmicos.
Eu também vi um moço alto passar protegendo a sua pasta
com documentos mais importantes que sua saúde,
afinal de contas sua camisa branca já estava colada em seu corpo
que pegaria um resfriado naquele instante.
Eu vi senhoras correndo e quase caindo, pobrezinhas.
Elas queriam chegar mais cedo em casa para fazer aquela sopa
quente que o marido e os netos gostam.
A chuva estava muito fria e um tanto forte.
Quem tinha guarda chuva era considerado burguês.
Então viramos burgueses assim de repente, eu e meu amigo mais alto.
Até porque ele sempre terá um lugar em meu grande guarda chuva desenhado
de xadrez e vermelho.
Nos achavam burgueses e realmente éramos.
Mas havia um detalhe importante na questão:
Somos burgueses por amor, a chuva é a revolução,
lutamos contra ela, mas no fim... sempre dividiremos
nossos guarda chuvas.



Para o meu melhor amigo Lucas Miquelon.