quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Soul's doctor

─ Sabe Ringo... eu sempre quis ser médico. Acredita? Desde pequeno eu queria um carrinho, mas não qualquer um. Eu queria uma ambulância! Daquelas com cruz vermelha... Minha mãe me deu uma aos três, foi muito bom. Brinquei até a borracha dos pneus gastar, como se fossem pneus de verdade. Gastei toda borracha, mas o meu sonho ainda não havia sido gasto. Quando comecei a encarar as matérias na escola, como biologia, eu tinha certeza que era exatamente aquilo que eu iria fazer.

─ E em qual área você queria estar?

─ Eu seria um bom pediatra, todas as crianças gostavam muito de mim. Raramente me metia em brigas.

─ Eu seria ginecologista.

─ E acha que iria pegar só carne boa, John?

─ Panela velha também faz comida boa, Paul.

─ Mas e se a panela velha está com muita sujeira, hein?

─ Eu adoro um bom tempero.

─ Que nojo. Você é um porco do caralho. Hahaha!

─ Mas e aí? Você queria ser médico e não foi.

─ Óbvio que ele não foi, a não ser que ele dê plantão quando a gente tá trepando com as fãs.

─ Não, haha. Eu não faço esse tipo de plantão.

─ Então?

─ Eu vi que tinha que dominar matérias que eu não gostava. E meu repudio era maior do que meu sonho. Quando cheguei em casa,  um tio chegou com uma guitarra velha que havia encontrado no lixo. Ele arrumou novas cordas e pintou. Ficou bonitona.

─ E ele te deu?

─ Que nada. Eu tive que pagar. Mas foi por um preço justo. Hoje ele faz réplicas das guitarras que nós tocamos.

─ Que idade você tinha?

─ Tinha uns treze.

─ Se você estivesse com ela ainda, muita gente iria querer comprar.

─ Não estou com ela agora.

─ Agora?

─ É, John. Ela está lá no palco.

"Se ele pudesse salvar vidas,  ele salvaria. E não deixou de fazer tal ato nobre, porém, de uma forma diferente. George salvou vidas de forma plena. Salvou almas de suicídios e corações de infarto pós trauma. Salvou a vida de uma geração que estava presa em sua casa. Salvou pessoas que anos mais tarde estaria escrevendo sobre ele."

domingo, 18 de novembro de 2012

Dear, Âmbar.

És ela e somente ela que me aflige esse peito velho.
Há marfim em sua boca, acompanhado da preciosidade de seu sorriso.
Os cabelos são de ônix, a noite o plagiou por cobiça.
O vento invade tanta formosura em forma de dança.
Venta, venta, venta.
E se move o doce balanço de suas madeixas.
Sua pele é feita de pérolas, mas nenhuma ostra as acariciou.
Quem dera se tamanho bicho misterioso obtivesse o prazer
que tanto almejo nessa vida de martírios.
E visto que meu estado não é dos mais saudáveis, clamo por sua misericórdia.
Esmeraldas são seus olhos, lapidadas pelas lágrimas de ternura que os banha.
Em suas veias correm os rubis, gritantes e vivos. Pulsam feito a vontade que me cerca,
me arrebenta só de pensar que por ela morrerei a suspirar.
A voz, uma safira. Muda a cada tom.
Semana passada estava azul, ontem lilás e hoje cor-de-rosa.
De tantos tons, raridades e formas, abstenho-me neste breve contexto.
Sois anjos agora, quando a morte em sua imensidão a alcançou.
Para ela valiosa como a causa de tantas guerras civis, para mim o desespero.
A dor inquebrável, como pulseira de diamantes.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Death's blow

Em meio ao deleite profundo de seu sono pesado, jazia seu corpo na cama de lençóis brancos. Talvez fossem de mil fios egípcios ou até mesmo de nenhum. A expiração quente que aquecia parcialmente parte de seu colo foi acelerando aos poucos, saindo de seu estado de paz até a dura realidade.
Sua íris tinha uma coloração semelhante ao mel, porém, não tão enjoativa quanto o resultado de um trabalho árduo das abelhas. Seus dedos fecharam-se nos lençóis macios, quase sem força. Jamais acordava com força, isso nunca acontecia e hoje não seria diferente.
Procurou seus chinelos na cama ao sentar-se na beirada, mas não os encontrou. Onde estariam?

Pouco importa.

O chumbo que presenciava sua cabeça, agora doía. Mas nada como um analgésico para melhorar o dia. De perna em perna, direcionou-se para a porta.

"Track."

Girou a maçaneta, nada aconteceu.

"Track" 

E nada. A chave não estava na fechadura, não havia ninguém em casa. Morava sozinha, onde ela poderia estar? Objeto traiçoeiro que vinga todos os amantes negados.
Locais fechados a deixavam desconfortável, um início de claustrofobia? Quem sabe? Ainda estava escuro lá fora devido ao repugnante horário de verão. A figura de uma jovem cansada fora refletida no espelho de moldura medieval dourada, mas a imagem não lhe surtiu tanto efeito. Sentia-se assim mesmo, cansada.
Dobrou os joelhos e abaixou-se para olhar abaixo de sua cama, talvez a chave tivesse ido parar lá, por algum acaso dessa vida.

Não estava.

Uma leve dormência alcançou suas costas, fazendo com que a espinha dorsal não trabalhasse por alguns segundos. Ela então repousou as pernas abaixo da cama, apoiando os braços no colchão. Quando seus olhos direcionaram-se para a porta na esperança ridícula de que a chave estivesse lá, gelou.

A figura de um homem estava parada diante de si.

De estatura alta, pele branca, vestes negras e cartola, ele sorri. Revelou dentes perfeitos semelhantes à sua cor.

─ Quê faz aqui?
─ Não tens o direito de perguntar isso, mas se és atrevida para fazê-lo, deverei lhe questionar algo.
─ Saia já daqui. Eu vou chamar a polícia.

Mas quando virou o pescoço para procurar o telefone, não o encontrou. Teria tido o mesmo destino de sua chave?

─ Sempre assim, essas novatas... Como se chama?
─ Olha moço, é sério. Destranca essa porta.
─ Para quê?
─ Eu quero sair daqui.
─ Mas não pode.
─ Claro que posso.
─ Não, você não pode.
─ Prove que não.

O homem levou a mão ao bolso interno de suas vestes, retirando de lá a pequena chave cor de cobre que ela tanto procurava. Deu alguns poucos passos para trás, sem dar as costas à ela. Colocou-a no buraco da fechadura e assim que girou-a, o eco do trinco destravado soou no quarto. Quando abriu a porta, os olhos da jovem foram tomados por pavor.
Havia outra porta, idêntica à de seu quarto encarando-a.

─ Mas o quê? Abra!

Como um robô, o homem repetiu o processo. E outra porta apareceu.

─ Isso é algum tipo de brincadeira?
─ Não, não é.
─ Por que não me deixa sair?
─ Não sou eu quem não a deixa.

Ainda com metade do corpo no chão, abaixo da cama e de braços apoiados no colchão sentiu-se vulnerável. Um sentimento que se misturava a angústia de que estava se atrasando para algo, qualquer coisa que fosse. Levantou-se de supetão, abrindo as cortinas. Essas abriram normalmente, acalmando seu coração que já esperava por tecidos materializados do nada. Mas quando abriu a janela, outra a encarava.

E outra. E outra. E outra. E outra. E outra...

O homem havia sumido, mas deixara a chave no trinco. Correu até ela, tropeçando ao pé da cama, onde bateu o joelho direito com força.

─ Porra!

Girou a maçaneta,  mas outra porta a encarava.

E outra. E outra. E outra. E outra. E outra...


"Quando eu lhe disse que haveria algum tipo de luz em sua vida, nunca quis dizer que seria aquela luz onde todos dormem. Era aquele fiasco de raio de sol que atravessa nossas cortinas. Aquele abajur que está para queimar, aquela luz colorida natalina que você tanto adora. Por algum tempo você dormiu no escuro, mas em outros tempos havia claridade para lhe acompanhar. Pergunto-me se alguém está segurando algum tipo de vela neste quarto escuro, pois você o teme. Eu sei disso. mas não há nenhuma possibilidade de que a luz dos teus olhos ilumine este lugar?" 

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Write down that idea

─ Sabe, eu fico imaginando como tudo seria se eu não tivesse vindo morar com a tia Mimi.
─ Ué, como assim?
─ Se eu tivesse ficado com o meu velho, se nunca conhecesse de fato a dona Julia, como tudo seria?
─ Acredito que bem diferente.
─ Será?
─ Não sei, só disse por breve reflexão mesmo.
─ Hmm. Talvez eu não sentisse tanta falta dela, essa dor que vem dentro de repente às três horas da madrugada. É foda cara, eu não posso nem pegar o violão porque a tia Mimi não deixa, diz que os vizinhos irão chamar a polícia. E se pego e toco baixo, ela cutuca meu chão com o cabo da vassoura. Então descubro que não tem polícia e nem nada, ela só estava querendo dormir.
─ É compreensível. Acho que ela está abalada também. Mesmo com a luta dela em te tirar da dona Julia, ela gostava da irmã.
─ Gostava, só é um pouco durona.
─ E parece que genética fala tudo, não?
─ Se foder com isso, Paul. ─ Um breve sorriso pela primeira vez, durante a conversa.
─ Mas por que você está pensando nisso?
─ Não sei, eu penso em muitas coisas. Estou parado e minha cabeça vai longe. Desde elefantes africanos até o Vietnã.
─ Ué, e por que logo o Vietnã?
─ Também não sei, mas tenho uma simpatia estranha com ele. Como se algo fosse acontecer, e eu quisesse cuidar.
─ Do Vietnã?
─ Também, mas das pessoas. Eu gosto de cuidar, e gosto que me escute.
─ Sem problemas, eu meio que sabia que iria me chamar hoje.
─ Ah, é? Eu ando te chamando muito.
─ Sim, meu pai já perguntou porque ando com as roupas rasgadas.
─ Sou o ativo, hein?
─ Hahaha, palhaço! É foda subir nessa árvore todos os dias, acho que estamos acordando os pássaros.
─ Existem pássaros com insônia também.
─ Mas existem pássaros dorminhocos.
─ E existem pássaros pretos.

Silêncio...

─ Espera... Você tem uma caneta aí?

domingo, 30 de setembro de 2012

The morality's cave

Se a maldade foi implantada em nosso código genético, seria possível reverter essa mutação? É preciso entender que ser selvagem nada tem a ver com a falta de piedade que os seres humanos têm demonstrado.
Faz parte da natureza o predatismo, não há choque em ver um leão matando uma zebra, seu instinto é esse.
Mas não há uma explicação sensata e racional para explicar o motivo de uma pessoa ferir outra.

É claro que faz parte do ser humano defender sua família, amigos e a si mesmo. O organismo é quem cuida desse lado defensivo em alguma situação de risco, é mais que autopreservação.
Ainda assim, quem dera se o mundo fosse feito por pessoas na defensiva e não somente no ataque sem alguma razão lógica.
O rótulo racional começa a ser duvidoso diante de tanta irracionalidade cometida pelos neurônios que deveriam auxiliar no pensamento, não em crimes com alto índice de crueldade.
Se a evolução criou um monstro frio e egoísta, não teria sido melhor continuar se expressando com uma linguagem não verbal nas paredes de um lar seguro e rochoso?

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Put your arms around my life

Já não tenho aptidão para lidar com tantas cobranças e descontos em minha pele. Cada dia que passa tenho mais certeza que sinto náuseas de liberdade, mas esse vômito não chega nunca.
De que adianta chorar nos ombros daqueles que são despreocupados da minha realidade? Desabafos não são suficientes para fazerem ideia do que venho passando nos últimos anos.
E se faço menção do autor de meu desespero, me julgam mal, pois não carrego os anos da experiência para sempre ter razão, é verdade.
Mas se os jovens são tão tolos e desmerecidos da razão, eu pergunto: E quando a idade era jovem? Será que os argumentos ditos aos gritos fariam tanto sentido como são proferidos nesse instante? Mas é claro que fariam.
Já não há o senso da igualdade nessas questões há muito tempo. E os herdeiros do repúdio nadam na corrente que vai direto para as pedras. Sorte de quem não agonizou em sua morte e se foi sem encarar os olhos do sacrifício.
Até mesmo a idade está corrompida, sendo que jamais fora livre para dizer o que sentia, repeliu seu sentimento a não ser o pessimismo que atinge todos os caminhos, exceto sua própria rota.
E eu lhes pergunto se esses dias irão terminar de uma vez ou se o tempo dirá quando for o momento certo para começar a andar.
O tempo anda, corre, se apressa e para. Doente de tanto esperar por sua maratona que atrasou. E esse desespero é tolo e meticuloso, pois veste máscaras diversas, tanto que nem mesmo dois anos são suficientes para mostrar todo seu vestuário.
Há tantos hematomas em meu corpo que é preciso saber onde observá-los. Uns estão invisíveis até para meus mais sólidos confidentes e outros escancarados e gritantes, esperando serem invadidos pelos companheiros, para enfim se deitar e chorar. Pelo dia que se fora sem ser realmente vivido.
A ânsia que aos poucos clamava por oxigênio, agora vira soluço e se afoga nesses mares de incertezas. O horizonte está muito distante e jamais sentirá um afago que desperte a validade de seu viver, talvez daqui uns anos quando o silêncio encher o frasco da esperança macabra. Deixo que julguem o quanto quiserem, a realidade de cinismo pouco me importa.
Mas não pense que essas artérias são justas pelo fato de existir, não. Já que pouco se fala nisso, por que entender o desnecessário? Seria como atravessar um labirinto com paredes imaginárias, diferente da realidade aqui vivida.
As paredes só não são mais sólidas do que o desprezo que nasceu no resquício de um nome que pouco importa agora.

sábado, 1 de setembro de 2012

And me? I'm here.

Neste teto de dois metros noto que os centímetros já não estão tão alinhados assim.
As medidas que aparentemente me dão conforto, me sufocam aqui dentro.
Há grades por todos os lados, negras como está hoje lá fora.
Quando a noite é escura, o breu vai se divertir.
E eu? Aqui.

A televisão já vai começar a mostrar o programa diário das seis da tarde.
É muita sujeira para pouca informação. Não quero ser telespectador,
mas se me recuso a ver o espetáculo, me apunhalam com mal dizeres.
Os jornaleiros fecham suas lojas e vão se divertir.
E eu? Aqui.

Em meu balanço posso ir mais longe, fui vetado daquilo que almejei,
já sou velho para as restrições que me aplicam em vão.
Não há como provar se o teste não me é oferecido.
Os semelhantes foram se divertir.
E eu? Aqui.

Sonhos incompletos e roteiros nunca escritos,
é passatempo diário de um viajante sem passagem.
As aparências podem enganar outras populações, mas
a mim nunca enganou. Eles não foram se divertir e é
por isso que eu estou aqui.


quinta-feira, 16 de agosto de 2012

A pseudo-analysis

Se ela é tão equilibrada, seria eu deficiente do labirinto? A figura feminina que rodopia feito peão, mas que é mais graciosa do que um objeto que custa pouco.
Talvez a cidade não seja maravilhosa, ela não é nada comparada ao seu bom humor quando entra na loja de discos, nem mesmo os bordéis mais tradicionais são tão eróticos feito o seu cruzar de pernas.
Há uma linha tênue, quase invisível  entre os girassóis e seu sorriso ao deliciar-se com suco de laranja.
A biblioteca Nacional do Rio de Janeiro abandonaria suas prateleiras para que pudesse ser tocada pela curiosidade que há em seus dedos.
Se fosse nascida, a revolta da Chibata não ocorreria por castigos físicos. Que marinheiro não gostaria de apanhar por ela? Se pedisse, uma âncora seria colocada no lugar do Cristo só porque ela adora a moda náutica que Coco Channel criou nos anos quarenta.
Se seu vestido voa, não há nada que ouse se mover, ela não faz ideia de seu poder.
Frequento uma loja de discos desde a adolescência, tento conseguir um sorriso do dono desde então, na época boêmia as prostitutas pareciam o símbolo ideal de erotismo.
Os girassóis se movimentam por um amor platônico pelos raios ultravioleta, as laranjas que escolhi apodreceram antes do meu notar.
As folhas dos livros me cortam e sua poeira serve como defesa para minhas mãos grosseiras.
Nenhum marinheiro apanharia por mim, mas me arrebentariam se eu resolvesse mudar o Cristo de lugar.
Quando caminho, panfletos inúteis são jogados em meu rosto.


Ela é um anjo porque eu sou um demônio.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

There's no way to arrive

Ninguém pode falar tão bem da solidão como uma pessoa solitária. Será? Para sentir solidão é necessário que algo esteja vivo? A respiração é tão indispensável assim? Visitei alguns lugares que acreditem ou não, esbanjam mais solidão do que muita casa abandonada por falência nos anos dourados.

E se falarmos hoje de ferrovias? Muitas pessoas não tem nem ideia de que o Brasil era um país onde as ferrovias mandavam! E literalmente falando! Eram trens de carga gigantescos, com vagões que transportavam coisas variadas, mas hoje não transportam nada além da lembrança de uma utilidade que um dia foi essencial.
Elegantes com seus chapéus para se protegerem do sol, as moças apostavam nos laços e em rendas para que seu estilo discreto e comum fosse chamativo para algum rapaz de cartola e gravata. Houve muitos olhares e até certo atrevimento por parte dele. Imaginem só! Sentar ao lado da moça sem dizer nada. Ou pior, comunicar (isso mesmo, apenas comunicar) que iria se sentar ali mesmo.

Quantos vagões foram testemunhas desse crime terrível contra os tempos?

Acredito que a criminosa nessa história foram as rodovias. Ah! Malvadas! Por que acabaram com todo o glamour dos trilhos? Com seu asfalto quente, contribuindo para as ilhas de calor das cidade metropolitanas. Quem foi que as deixou invadir assim as nossas vidas? Maldito Hitler! Quem disse que ele poderia lotar a cidade de fuscas? Não lembro de uma permissão assinada por você, caro Vargas.

Se estávamos do lado dos aliados por opressão dos Estados Unidos, oh! Tão poderosos! Como o senhor deixou que os fuscas lotassem o Rio de Janeiro? Céus! Por quê?

Hoje as ferrovias choram por seus trilhos enferrujados. Cidade natal do tétano e das velharias que aparentam ser mal assombradas. Há tanta fumaça cobrindo nossas nuvens que internamente os vagões dão risada de nossas faces, eles podem já que foram rejeitados sem aviso prévio.

Para os inconformados que ainda aderem aos trilhos sobreviventes desse massacre ingrato deixo o meu abraço. Sou do time de vocês. A janela que revela os trilhos sempre foi minha melhor amiga, acreditem. Os trilhos são fortíssimos, até mesmo os que estão quebrados. Não há como dizer que um material é fraco se você o joga contra a parede durante muito tempo.

"Se o meio em que vivemos depende de nossas ações por que diabos estamos matando tudo de uma vez? Somos homicidas da vida alheia, da própria vida e da vida de quem amamos. Olhei para o alto e vi um céu rancoroso. Seu cinza não lembrava o prateado, mas sim o chumbo. Como balas de canhão prontas para cair em cima dessa cadeia de mal amados. Hoje é um dia importante para essa aquarela opaca, é dia de lavar os pincéis. E durante tal processo, notar que as cerdas foram ralo abaixo. Se não cuidas de sua pintura e do modo em que ela é feita, a natureza e o tempo lhe roubam a ferramenta necessária."

sábado, 7 de julho de 2012

Lucky drummer

─ Ei, ei. Você é muito talentoso. Não ligue para elas.
─ Fácil falar isso. Você é tão adorado por elas que essas meninas te dariam até a virgindade se pudessem embalar em uma caixa.
─ Opa! Eu gosto desse tipo de caixa.
─ Para, John. Estou tentando animar ele.
─ Pelo amor, Paul. Elas vão adorar esses olhinhos claros quando o ódio delas sumirem.
─ Nisso eu concordo. O Pete nem era tão bonito assim.
─ E qual é teu conceito de beleza, George?
─ Meu espelho.
─ Hahahaha, tá se achando!
─ Sério. Sou tão bonito que se eu tiver um filho, ele será igual a mim. E você vai se assustar quando for tocar com ele, McCartney.
─ Nos seus sonhos, George. Hahaha.
─ Pelo menos você tem boas piadas, Ringo. E se não funcionar, a cada risadinha não dada, uma menina pode escolher um anel seu.
─ É mesmo!
─ Verdade!
─ Não! Para, eu não vou dar meu anel pra elas.
─ Então dá pra mim?
─ JOHN CALA A BOCA!
─ Hahaha, é só uma gracinha Paul, ai ai!
─ Vou fazê-las gostarem de mim pelo meu talento mesmo. Eu já tenho sorte. Que ela ande ao meu lado, então.

E andou até hoje, não é mesmo?

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Be brave


Se ele fosse um lunático, que mal teria? A Lua é tão admirável que desprezar seus tão sonhadores habitantes, parece muito contraditório, não?

─ Querido, feliz aniversário! Suas nobres tias da Escócia lhe mandaram presentes!
─ Obrigado, mãe. É mesmo? Vou ligar para elas agradecendo assim que voltar.
─ Muito bem, agora vá. Seus amigos estão te esperando. 
─ Ok, tchau.
─ Tchau, meu amor!
─ Bom dia, senhor.
─ Bom dia, meu rapaz.
─ Bom dia, senhora.
─ Bom dia, filho! Ah, esses jovens quando sentam ao nosso lado, mal olham nossa cara. Sua mãe te criou bem!
─ Obrigado, senhora.
─ Que gracinha!

Dentro de todas as normalidades, tudo estava no plano de rota. E as coisas eram boas assim, mas a gente sempre espera por algo novo, não é? E acreditem ou não, pode ser bem surpreendente.

─ Eu vou descer.
─ Mas não é a sua parada, menino.
─ Não importa, eu vou descer assim mesmo.
─ SENHOR! SENHOR!
─ Mas pra quê tanta gritaria, meu Santo Deus?
─ De onde ele vem?
Isso aí?
─ Sim, senhor. De onde?
─ Ah. Comprei em um leilão. Mas não presta! Tem medo das pessoas, atacou vários espanhois.
─ Ele veio da Espanha?
─ Sim, das grandes touradas! Mas acabou se escondendo e o antigo dono não quis mais!
─ E teve mais?
─ Que nada! Todos viraram troféu.
─ Quanto pagou por ele?
─ Olha, moleque... Eu não vou vender ele. Deu trabalho pra mandar trazer! 
─ Quanto pagou por ele, senhor?
─ Duzentos euros.
─ Eu compro.
─ Eu não estou vendendo.
─ Eu compro do senhor por quinhentas libras.
─ E você lá tem quinhentas libras na sua casa?
─ Em casa não, mas no meu bolso. Toma.
─ De onde você tirou?
─ Minhas tias me deram.
─ E por um acaso você é rico?
─ Não. Elas moram na Escócia. Casaram com condes.
─ E por que te deram todo esse dinheiro?
─ Pelo meu aniversário.
─ E você vai gastar tudo com isso aí? Não deveria estar comprando roupas, sapatos ou coisas assim?
─ Não. Eu deveria gastar com o que achasse melhor. Então, temos um acordo?
─ Pense bem, não vou lhe devolver o dinheiro!
─ E nem eu o touro!

─ Por que você demorou tanto? Achei que íamos ver aquelas guitarras!
─ Você tem alface aí?
─ Aqui? Em casa? Por quê? Você não almoçou?
─ Almocei, o coragem que não almoçou!
─ Quem?
─ O Coragem, George. Eu não sei o que dar para ele...
─ Quem é Coragem, Paul?
─ Meu presente!
─ Mas que...
─ Olha.
─ VOCÊ.... Comprou um touro?
─ Comprei. O antigo dono dele era rude.
─ E como devem ser? Deus, Paul! Sua mãe vai te matar.
─ Por quê? Ela disse que eu poderia comprar o que eu quisesse.
─ Mas se você queria um animal, por que não comprou um cachorro ou adotou?
─ É que o dono dele estava incomodando o Coragem. Ele passou por muita coisa já.
─ Ai, ai. Acho que tenho alface na geladeira.
─ Maravilha, Ge! Você é demais!
─ Ouviu, Coragem? O almoço tá pronto!

E Coragem viveu tão feliz, que passou a média de seus descendentes espanhóis. Todos os dias demonstrava gratidão. E o menino de expressão serena, amou o seu presente como nunca amara outro. Era seu aniversário e sabia que tinha alguém para comemorar.



sábado, 9 de junho de 2012

Old book, same history

Se a música é a nossa alma sonora, notas fracas e letras sem nexo seriam para os desalmados?

É muito comum entrar dentro de um ônibus e escutar um som esquisito ou irritante em plena manhã de segunda feira. Isso só faz com que a nossa viagem seja mais longa, e até nos esquecemos de que há imagens lá fora. Realmente há! Mas quem é que consegue contemplar o parque do Ibirapuera quando a trilha sonora é desgastante?

Claro que os fones de ouvido seriam a solução. Em alguns transportes públicos de algum estado quase ético exige que aparelhos sonoros devam funcionar apenas para seus donos, mas isso resolve alguma coisa?
É como fechar os olhos para o problema. Se as pessoas usassem fones de ouvido, elas continuariam escutando aquela mesma batida de que todo mundo gosta e fala.

Mas o que há com elas?

As gerações evoluíram, claro. E isso foi ótimo, nunca fui contra a evolução, embora eu tenha o meu lado velharia bem apurado. Mas se elas evoluíram, por que é que o conceito caiu? Ou melhor, não restou conceito algum! O senso crítico deu um tchauzinho junto com os jovens estudantes que tanto lutaram pela democracia.

Hoje a luta mais interessante que podemos ver é uma briguinha de twitter da qual não resultará em nada. E esses resultados me assustam. Não quero ser a solução desse problema, mas não quero ser a causa dele. O que, afinal de contas, eu quero ser?

"Sou um velho livro largado nessa prateleira. Hoje em dia ninguém quer me folhear. Penso que fiquei desinteressante, mas logo o meu epílogo me dá a lembrança de que algo escrito não pode ser mudado. E se em minha época eu era interessante, como poderia deixar de ser nesse século maldito?"

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Talk more, dear inside

Durante as duas últimas semanas nós pensamos muito a respeito disso. Lembramos das vezes que tudo parecia perdido, que nada poderia dar certo, e que nunca iríamos chegar até aqui.
Achávamos que as coisas iriam demorar, ou que talvez nada fosse dar certo. O funcionar era incerto, e tudo o que tínhamos era nada.

Hoje estamos com outras ideias. Mais maduras, talvez experientes, mas com a mesma essência. Porque nós não podemos perdê-la, ela é valiosa. E não somos arrogantes, pelo contrário. Temos total autonomia para saber que algo de valor nos pertence. A hipocrisia acompanhada de falsa modéstia não foi feita para pessoas que possuem a nossa marca.

Não é cicatriz, mas também não é o hematoma abstrato que dizem por aí. Ele existe dentro de nós. Seu tamanho não sabemos, depende da situação em que é exposto, não?
Ele sente cada sensação que nos invade, e é terrivelmente doloroso quando se apega à dor.

"Ontem andávamos a cavalo. Brincávamos de nos esconder, o ar era nossa cobertura. Foi tão interessante nossos tempos de juventude que hoje não conseguimos mais nos lembrar dos detalhes, pois são momentos da época. Não há como retirar nossas lembranças, nós mesmos as jogamos fora. E isso dói de uma maneira particular quando folheamos os velhos álbuns de fotografia. Estamos crescendo, e para o desespero de sua mente, ela continua jovem." 

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Walk immigrant

Quando ela anda de bicicleta tudo se resume à alegria
do momento. Seus joelhos hoje agradecem pela pausa
de bruscos tombos.

O passeio é calmo, pois já passou das três.
Em seu pescoço carrega uma Polaroid,
pronta para ser usada quando avistar um coiote.

Nessa região eles não vivem.
Sempre é bom estar preparada.
Os pinguins estão migrando no verão.

Há um cavalo à sua direita comendo grama.
Ele mata sua sede de orvalho.
Ali não há esquilos, eles são somente imaginários.

O passeio está terminando assim como o ar de seus pneus.
Usou a câmera assim que avistou um cachorro.
Hoje o dia não está para coiotes.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Drawing the wall

Você já ouviu falar em sanidade? Desde quando essa palavra é familiar? Se for dizer que ela se tornou familiar quando você começou a ler livros, escrever ou assistir séries, você está errado. Porque ninguém sabe quando ou onde a palavra sanidade invadiu a sua vida.

O que é ser sano? Quando crianças, falamos sozinhos o tempo todo. E isso faz com que as pessoas ao seu redor te achem interessante, um gênio ou apenas criança. Mas se um adulto começa a exclamar palavras pelo ar, ele não é sano. Ele é insano.

Estranho, não é? Como algumas coisas mudam quando a gente cresce. Falar sozinho na infância é algo normal, mas a maturidade não tolera esse talento, ela o expulsa da sociedade. E você acaba preso em uma camisa de força, dentro de um lugar. E quanto mais sua voz for usada para ninguém, mais ela não terá valor. Pois ninguém tem seriedade numa conversa de loucos.

É confuso o modo de vida que as pessoas aderem quando ficam adultas. Outras preferem fugir das responsabilidades, tornando a vida mais imprevisível, mesmo que a diversão um dia acabe e eles tenham de ouvir o relógio despertar.

No mundo dos sérios, as artes ficaram para trás. E há muito tempo, (muito mesmo) que não seguramos um giz de cera, uma folha de papel colorida e brincamos de inventar o sistema solar. Já não há mais casas com telhado laranja, já não há estrelas azuis, nem luas lilás, muito menos cavalos caramelos.

Hoje só existe o cinza, que apesar de muito elegante, não combina com nada, a não ser que desenhemos muitos elefantes. Você os faz?

"Veja. Juntei todos esses pensamentos para você ler. Tem coisas boas, más, outras tolas. Tudo está amontoado aí. Não tive tempo de organizar. Só queria que ela ficasse com alguém. Estou partindo para uma viagem, vou demorar para voltar. E meus pensamentos novos não cabem ali se os antigos ainda estiverem ocupando algum lugar. Não estou me desfazendo deles, é um empréstimo. Cuide bem deles, voltarei para buscá-los. Achei mais prático do que comprar uma mala maior. Lhe mandarei alguma carta, um pensamento aleatório, talvez de Paris, mas saiba que nenhum será tão valioso quanto esses aí. Meus pensamentos de sempre que deixo para você vigiar. Cuide deles, eu insisto. Pois neste mundo, tem muito louco querendo resquícios de algo cultural. Não deixe, seja egoísta. Pois a minha tortura interna é saber que eles ficarão longe de mim."

sábado, 12 de maio de 2012

A movie about you

─ Mas isso é muito complicado!
─ Nem é. Quando você pega prática, não consegue largar.
─ Credo! Como um vício?
─ Bem por aí. Mas convenhamos que é um vício artistico.
─ E isso existe?
─ Se eu acabei de dizer, então existe.
─ Muito bem!
─ Nem sempre vícios são ruins.
─ Não?
─ Existe o vício afetivo.
─ Existe ou você acabou de dizer?
─ Acabei de dizer.
─ Então existe.
─ Exatamente!
─ Mas falando sério agora. Quem inventou?
─ Bom, Steve Sasson trabalhou muito em um laboratório da Kodak, sabe?
─ Ah! Dessa eu lembro. Tínhamos uma!
─ É, tínhamos.
─ Sua avó também tinha.
─ Ainda tem! Ela recusou a era digital por uns tempos, mas depois que os filmes ficaram difíceis de encontrar, desistiu.
─ Ela te deu?
─ Ainda não.
─ Mas com certeza vai dar.
─ Pode dar, mas tenho vontade de ter uma Polaroid.
─ Pola o quê?
─ Polaroid! Não é do seu tempo.
─ Nem do seu.
─ Eu gosto de coisas vintage.
─ Vintage? Quantos nomes diferentes.
─ É, retrô.
─ Ah.
─ É aquela que a fotografia sai pelo buraquinho.
─ Mas como acontece aquilo?
─ Também queria saber!
─ Seria um filme diferente?
─ Não faço ideia.
─ Que pena...
─ O que você está escrevendo?
─ Poemas!
─ Aqueles de sempre?
─ É, aqueles.
─ Eu gosto.
─ Gosta? Você nunca me disse.
─ É... não deu tempo.

"E um dia, talvez, eu tenha desejado muito ter dito coisas que não disse. Pois esse maldito dia esfrega na minha cara o quanto eu poderia ter sido melhor. Me abrir mais, mostrar mais sentimentos. Ser mais amiga, ou talvez, apenas uma boa ouvinte. Das horas de radinho de pilha, não me arrependo. A única coisa que nunca poderei compreender foi o motivo. O que causou todo o terror, a desgraça e o horror que vivemos. Não. Nós não merecíamos. Todos podem servir como nossas testemunhas. Eles sabiam que nossa relação era inatingível. Mas alguém ousou rompê-la. E me desculpe se matar é um crime, mas eu o faria. Rasgaria a enfermidade para tê-la ao meu lado."

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Don't pull me hard.

O que é festa, para você? Se seus pensamentos foram de encontro a brigadeiros, bolo, parabéns em forma de constrangimento e entes queridos, provavelmente você não entende o conceito de festa. Festa e aniversários são coisas diferentes. No aniversário, você comemora mais um ano de seu nascimento, ou do nascimento de seu amigo, parente, etc. No geral, alguém está ficando mais velho! Já a festa, pode ser a celebração de qualquer coisa, ou mesmo a não celebração.

Mas festa nem sempre é regada de doces e bebidas. Há algumas que fazem mal. Não para seus convidados, mas há anfitriões obrigados a estar ali. E isso é deveras terrível
Eu já fui obrigado a estar em uma festa que eu não queria. Vi pessoas se divertindo, gente atrevida, gente feliz e gente que não se importava se eu estava em um estado pleno de alegria. Acontece que eu não estava, mas ninguém notou.

Não vamos exagerar, certo? Há pessoas maravilhosas nesse mundo que não precisaram estar naquela festa para ver a minha agonia. Algumas não tiveram coragem de ir, por outro lado, outras estavam me esperando. Chorando muito, eu notava isso. Mas não pude chegar perto delas, queria confortá-las. E desprendê-las de um mito idiota. 

A cor não significa nada para mim. Ela é tão insignificante quanto a minha dor. Ou o meu sofrimento, porque durante toda essa festa, eu sofro. E não é qualquer sofrimento bobo, como desses em que o garoto beija a outra na festa da namorada e ela tem o coração partido.
Há casos em que o meu coração literalmente se parte, ou pior. Eu perco a cabeça, de um modo geral, meu pescoço dá piruetas pelo ar, me estrangulando de um modo muito cruel.

Mas quem se importa, não é mesmo? É festa! É festa! É... velório.
Para minha espécie, toda festa acaba em velório ou em um estábulo onde um médico nos examina. Tem alguns que não se importam muito com a gente. Eles nos dão qualquer droga para aliviar a dor, mas uma quantidade insuficiente para dormir. Com a desculpa de que amanhã sentiremos dor de novo, ele terá de voltar e... começa o ciclo econômico.

Mas como eu disse a principio, existem pessoas boas por aí. Um deles resolveu me levar daqui. Deve ter pagado uma boa quantia em dinheiro. E graças a ele, posso contar a vocês o que eu vi ali.
Show de horror, peça macabra. E acreditem ou não, Stephen King choraria ao ver o meu sofrimento ali, a minha angústia. E nenhum livro ou filme poderiam tocar o coração dos convidados da minha festa.

Da minha festa... do meu funeral. Hoje eu vivo em uma fazenda bonita, com colinas, muita grama boa e carinho de meus companheiros. Ainda tenho marcas, muitas. Mas elas já não doem tanto assim, a pior dor é aquela que sinto antes de dormir. Quando me deito, olhando para as estrelas, fecho os meus olhos e consigo ouvir o barulho ensurdecedor dos gritos de parabéns. E são muitos, desnorteado, eu não consigo dormir logo de cara. Preciso de algumas coisas, drogas talvez. O doutor sempre vem com a quantidade certa para fazer com que eu não volte a pensar na dor, pelo menos durante aquela noite. Mas só para deixar de pensar, pois eu não consigo esquecê-la.

É tanta corda, tanto choque. Tanto dinheiro envolvido nisso. A minha revolta não é notada. Mas os meus ataques de fúria, sim. E se eu matei, foi porque estava cansado de não ser mais respeitado. Todo mundo tem os seus altos e baixos, mas garanto que não matei ninguém depois que sai de lá. Era uma prisão, de fato. Mas a liberdade que tenho agora, mesmo com cercas em volta de mim, é completa.

Ouso dizer que hoje sou feliz. Talvez nem tanto quando a noite chegar. O céu escuro me faz pensar, e muito. Eu penso em todos os que estão em suas festas, sendo obrigados. E de repente me dá uma tristeza, e eu choro.

"E quando a esperança resolver pular a sua porta, não se preocupe. Eu irei amarrá-la em uma corda, exatamente como fizeram com você. Puxando-a de volta a sua porta, porque não devemos fazer grosserias com quem não merece. E ela, contrariada, irá perguntar qual é o seu pedido. Você pode pedir o que quiser. Sem restrição. E de repente, a esperança me olha, e me concede um pedido em forma de desculpas. Eu não preciso pensar. É simples o que eu quero, mas complicado de ser realizado. Mas não ligo, eu quero isso. E peço, com muita clareza: Que os rodeios acabem de uma vez por todas."

domingo, 1 de abril de 2012

Swinging the weekend

Quando ouço o sino da igreja anunciar às dezoito horas, eu sei que o domingo realmente terminou.
Terminou para as crianças que foram ao parque, brincaram em brinquedos que são nostálgicos para seus pais, pois eles também já brincaram ali, enquanto seus pais, agora avós vivos ou descansando eternamente, olhavam-nos, lembrando de outra juventude, outros tempos.
O sol começou a ir embora, e o ventinho apresentou-se de forma inesperada para aquele casal que lanchava na sombra de uma árvore muito velha.

As crianças agora vestem seus casacos, os pais preocupados com sua saúde, e elas desligadas do mundo. Querendo brincar mais cinco minutos, cinco minutos que não devem ser ultrapassados, pois é seis da tarde! E às seis, é hora de todos voltarem para casa.

O chuveiro é ligado, a água cai. Água morna que acalma, relaxa os nervos, cura a raiva. Ela desliza por seu corpo como uma serpente, pronta para dar o bote. E o dá, quando atinge seus olhos, antes despreocupados, contemplando a luz mínima que ainda resta na janela minúscula do banheiro.
E essa água é tão diferente da semana, diferente do sábado, é a água de domingo.
Depois dela, virá o jantar. Que não será novo! O mesmo do almoço, menos gostoso, todos hão de confessar.

Mas é jantar de domingo, e nada deve ser especial, não mais do que o almoço. Que vem cheio de chatices e coisas parecidas.
Se você sobreviveu a este almoço de domingo, uma repetição menos atrativa não será nada além de prato esquentado.

"A sensação que todos tem, é a depressão dos fins de semana. A calçada menos pisada, vai se despedindo da alegria, pois sabe que precisa voltar a realidade. Sente pés alegres, cansados, devastados. Consegue distinguir quem está feliz, quem está sorrindo de jeito forçado. As ruas, novamente tristes, sabem que amanhã o caos virá correndo, estressado, barulhento e asqueroso. Ela sabe, assim como a avenida, os carros irão passar sem sua permissão, pois essa é a semana dando o ar de sua graça..."

quinta-feira, 15 de março de 2012

Can I buy an object?

Por mais que ela tente se acostumar com o mundo em que vive, nada parece dar muito certo ou fazer o menor sentido. Todos os dias parecem ser o repeteco do mesmo dia de dois mil e alguma coisa. Aquele de semana passada em que ela não viu que passou ou que simplesmente ignorou por descuido e colocou a data errada naquele documento ou mesmo em uma simples folha de papel.
Por que os dias andam tão iguais uns aos outros? Seria algo distante da realidade ou longe demais da fantasia? Não se sabe, mas de qualquer forma tudo parece ser o mesmo do mesmo que foi há um tempo.

Nada é novo, isso é frustrante. As pessoas também não são novas.

Ela aprendeu que a denominação perfeita delas é objeto. Umas fazem as outras assim, e tem outro grupo que prefere ser denominado desse jeito por escolha, são apenas objetos.

Ela muda um de lugar porque acha que fica melhor ali.
Ela quebra um por acidente, mas gosta de ter quebrado internamente porque não gostava de seu material.
Ela observa os traços, sente a textura, nada lhe atrai.

Existe muitos objetos no planeta. Os que mais se destacam são os objetos de fingimento. Aqueles que você compra em uma loja porque acha engraçadinho, mas acabam tendo uma inutilidade que só serve para ganhar espaço de algo que poderia ser melhor.

É a obrigação de ser gentil.

Por que a denominação de férias exige sol, praia e calor? Por que você é obrigado a sorrir diante de tanta coisa errada e ter que ser censurado quando a sua palavra vale a pena?

Por que os objetos resolvem mudar?

"Esses dias eu passei por um parque bonito. Lá encontrei uma folha simpática que me disse o quão chateada estava. Sua árvore a expulsou porque o outono estava chegando. Ela me disse que estava seca, mas que se bebesse a água da chuva iria se desintegrar. Ela também se lamentou pelos amantes das estações frias, pois sabe que é ruim ter de aguentar um fardo natural, mas é preciso. Perguntei o que poderia fazer para ajudá-la. Logo, sua expressão tornou-se brava. Pediu para que não a colocasse jamais em um caderno, pois não queria ser amassada. Queria morrer. Digna de todas as folhas, partes de si iriam voar e voar. Direto para as montanhas avisando que era livre. Pensando bem... até que ela adora esse outono que vem por aí."

quinta-feira, 1 de março de 2012

Wool deadly

─ Senhor!
─ Está tudo pronto?
─ Sim, senhor.
─ O tecido foi suficiente?
─ Devidamente, senhor.
─ Quantos estão vestindo?
─ Todos, senhor.
─ Sobrou mais?
─ Mais do que a metade, senhor.
─ Coloquem mais duas camadas. As que sobrarem, usem na cabeça de seus líderes. Fui claro?
─ Claríssimo, senhor!
─ Muito bem.
Heil, heil, heil!

Pátio sujo, empoeirado pelas cortinas de poeira que aqueles pneus novos estavam experimentando pela primeira vez, o barulho? Quase ensurdecedor. Motivo de pânico para todos quando os oficiais chegaram com suas camadas calorosas.
Um abraço fatal, a transpiração seria extremamente longa conforme o tempo, e quanto mais entardecia, mais quente ficava. 

Ar pesado sem ter massa. 
Garganta entre cortes sem nem sequer ser cortada. 
Mãos trêmulas sem uma sensação térmica exata.
Dor sentida, porém inexistente.
Sufocamento proposital, mas sem plumas para cobrir suas narinas.

Desidratação! Assim seria a morte de todos aqueles que não faziam parte da raça superior. Lã em pleno Rio de Janeiro, à 40 graus Celsius na praia de Ipanema.

Ele sairia de havaianas e coquetel, sugando o líquido gélido que mais parecia elixir da vida.

Assim seria o Holocausto, se Hitler fosse brasileiro.


"Diga-me o nome da pessoa que garantiu um tempo bom. Que ela não apareça em minha frente, pois meus atos não serão nada cautelosos. Cautela serve como adoçante para meu chá, que por sinal, não posso degustar neste momento."
 

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Let me speak for you, guys

IT'S BEEN A HARD DAY'S NIGHT AND I'M WORKING...
─ Como consegue cantar depois desse show, George?
─ Estou num puta pique, vocês não fazem ideia.
─ E por acaso andou tomando aquele ácido que deixei na pia?
─ Não, John. Haha, ainda não!
─ MEIA NOITE, MEIA NOITE!
─ E o que tem, Paul?
─ Por Deus, vocês! Ringo, abra a cachaça!
─ Não brindaremos com chá?
─ Claro que não! Nem em xícaras brindamos com chás, não chá puro...
─ Hahaha, malandrinho!
─ Quem quer começar a falar?
─ Vá você, John.
─ Por que eu? Você conhece o George há mais tempo.
─ Vá logo.
─ Suas bichas! Nem a porra de um discurso vocês conseguem fazer eu vou!
─ Mas...
─ É com muita honra que eu dedico essa noite e farra à você, querido amigo. Que consegue fazer solos incríveis, por favor, sem piadas. Que está sempre atrás de saias e meias sete oitavos, que adora uma boa farra e consegue ter a fama de quieto. Você! Que é amado, idolatrado e muito querido por nós, da maior banda do mundo, ou pelo menos do nosso mundo e de mais de meio milhão de pessoas. Elas te amam, nós te amamos e desejamos um feliz aniversário!

Aplausos.

─ Eu não faria melhor!
─ Nem eu.
─ O cara tem talento.
─ Obrigado, eu ensaiei para dizer na formatura, mas não fui o orador.
─ E agora usou consigo mesmo? Foi tudo decorado?!
─ Bem...
─ FILHO DA PUTA!

"George parecia uma pena. Leve, delicada, arrancando sorrisos de todos e dando esperança para as pessoas que não acreditavam poder voar. Ele podia. Voava alto e mostrava que solos eram o remédio de muita amargura e solidão em pleno ápice de abismo inevitável. Por um mundo com mais Georges, ou pelo menos algo parecido."



terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

The suicide window

É barulho nas ruas, gente bêbada, pessoas trepando no meio da rua, cornetas, fogos, sujeira, cheiro de... carnaval.
Não preciso dizer que é de meu extremo desagrado essa maldita data. Por quê? Muitos se enganam dizendo que o Brasil é o país do carnaval, a festa em si veio da Grécia. Mas claro, os brasileiros foram lá e deram um jeitinho para transformar marchinhas em putaria, bundas, peitos e samba. Lindo, não é?

A minha teoria é de que algum grego filho da puta veio aqui e resolveu animar as pessoas com uma festinha. Maravilha! O castigo desse grego deveria ser a crise na Grécia, se bem que... é, ele já foi castigado.

Há uma obrigação ridícula em ter de apreciar a cultura brasileira. Então eu pergunto: Que cultura? Carnaval não nasceu no Brasil. Só aderiu-se festas de outros países para ter algum tipo de "cultura globalizada" aqui. Festa tradicional brasileira seria se fizéssemos algo no aniversário de Machado de Assis, ou mesmo relembrar e festejar como estudantes lutaram bravamente por seus direitos na época da ditadura. Aí sim, seria uma festa tipicamente brasileira.

Mas não. Ninguém está com vontade de ler literatura ou história, as pessoas querem sair na rua, se divertir com a desculpa de que o ano só começa depois do carnaval. E se não existisse carnaval? O ano começaria quando? Depois da Páscoa?

"Sou um vidro. Eu vejo tudo quando a luz me deixa ver. Hoje vi que as pessoas estão menos despreocupadas, estão festejando algo que se forem questionadas, não saberão responder. O estranho disso tudo é que elas gostam de parecer burras e ignorantes. Me dá um aperto nesse meu coração espelhado, por quê? Na minha época de janela sessentista, tudo era mais calmo, tranquilo e bonito. Hoje vejo mulheres e suas vergonhas a mostra, vejo homens cortejando-as de forma vulgar, também vejo o semblante de alguns idosos, tristes... Tudo foi banalizado! Tudo! Ninguém pensou que o caos poderia acontecer. Fiquei com raiva quando soube que iriam me transportar para ser a proteção de uma janela em um carro alegórico. Me revoltei, e assim me suicidei. Cacos de vidros por todos os lados. Prefiro ser o novo amor da vassoura e da pá do que trair meus princípios e virar piada cultural."

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Darkening dusk

Ele estava cansado de sempre acordar do mesmo jeito, sozinho. Desejava que algo estivesse diferente, um dia dormiu ao contrário, posicionando os pés na cabeceira da cama, estava insatisfeito. Olhava para a janela esperando a mesmice ir embora. Ela deveria pegar a mala pesada, dizer adeus e partir.
Não, não. Nem precisava dizer adeus, era só ir embora mesmo. Se quisesse, poderia até deixar a sua mala ali, não iria fazer diferença. Nem se daria ao trabalho de jogá-la no lixo. Não era questão de guardar lembranças, só não valia tal esforço. Haviam quatro canecas sujas de café em cima de sua mesa, que como sempre, estava um caos. Não para ele, claro que não. Arrastou os pés até a cozinha, abrindo o armário para buscar a quinta, muito trabalho abrir-lo e fechá-lo! Resolveu deixar aberto mesmo, sem pensar que daqui algum tempo iria bater a testa ali, muito alto para tanto desleixo!

O café descia pelo filtro não muito higienizado, ecoou um barulho que ele detestava: Terminou. Faria outro mais tarde, mentindo para si mesmo? Estava na cara que levaria alguns dias para fazer, iria comprar no bar da esquina para mudar de ideia e buscar uma garrafa de vinho. Com esse pensamento, sua lavanderia virara uma mini adega. Havia várias garrafas que esperavam alguém, seria melhor beber com alguém especial. Mas não qualquer um. Seus amigos não sonhavam que havia tanto vinho barato nos armários que supostamente guardavam sabão em pó. Mas quem disse que vinho não é limpeza? 

Limpa-se desgostos.

De volta a janela, estamos contemplando o nada. Nas ruas pessoas passam apressadas, conforme as horas correm, elas desaparecem. Relógios! A solução das pessoas indesejáveis, ajuste os ponteiros para a hora exata em que elas dormem, e por fim, elas realmente irão dormir.

Soltou a fumaça do cigarro pelos lábios, tentando formar aquelas argolas que viu em algumas fotografias. Difícil, engasgou na primeira vez, na segunda frustrou-se, não houve uma terceira. Apenas tragou. Nada sob nada. Vazio fundo, livros abertos, páginas viradas, silêncio completo, caneca. As luzes dos postes já estavam acesas, a iluminação fazia com que ele enxergasse melhor o concreto. Duro como deveria ser, de má qualidade como todos esperavam.

"Os dias nem sempre devem ser perfeitos, assim como sabe-se que eles não existem. Dias são dias, noites são noites e tarde é a linha de minutos que separa o dia e a noite. Ela é sua amante. A noite ama a tarde, o dia não sabe que a tarde prefere a noite. O dia inseguro torna-se ruim, a tarde sente-se indiferente, a noite mostra que é melhor esquecer, segura a tarde pelos braços e a faz brilhar. A tarde é gostosa, a noite deliciosa, o dia não pode entender o que se passa, então vai embora. A noite envolve a tarde e vira apenas noite."

domingo, 29 de janeiro de 2012

Fake life

Quem foi que disse que o ano já começou? Tolos. Todos esqueceram que o ano só começa no outono? Não me parece nada saudável transpirar uma quantidade suficiente para encher uma piscina olímpica enquanto trabalha em algum escritório de pessoas poderosas, mas que economizam num ar condicionado vagabundo que não lhe trará frescor, mas sim problemas respiratórios.

Molhar as páginas dos livros com o suor de suas mãos, tentar prestar atenção naquilo que supostamente será útil pelo resto de sua vida. Porque é óbvio! Eu irei fazer cálculos estequiométricos sempre que eu for beber uma água com açúcar após ser assaltada.

Eu irei precisar de muito conhecimento em física para abrir uma lata, ou até mesmo para calcular a velocidade média enquanto jogo a bolinha para meu gato ir pegar, porque gatos adoram fazer isso.
Se irei fazer o de sempre, voltar com uma rotina que possivelmente me deixará muito aborrecida, por que fazê-la na estação conhecida como amostra grátis do inferno?
Ok, teremos que ir até a filosofia e explicar porquê uso o termo inferno se não acredito em Deus.

Desculpe. Não estou com a mínima vontade de fazer isso agora. Inferno é um lugar onde tem pessoas que não gosto, fazendo o que não aprovo e fingindo estar felizes como se não existisse um lugar melhor para elas estarem se não aquele mesmo.

Oh! Agora dá para entender porque chamamos vários lugares de inferno, não é? Mas não se preocupe, todos nós temos um inferno para estar. A coisa fica um pouco mais complicada quando começamos a chamar de inferno o local onde dormimos todos os dias.


"Se fingir é a nova moda, então qual seria o motivo das pessoas aparentemente boas seguirem essa tendência? Há modos positivos e negativos entre fingir algo para alguém. Fingir é uma linha muito curta que termina na mentira, que por ironia, é muito grande. Tenho que confessar que sei fingir muitíssimo bem, claro. Temos que aprender a nos adaptarmos no mundo em que vivemos, não é? A natureza manda. Mas não gosto de fingir, assim como não gosto de mentiras. Agora devo perguntar para você: Estou fingindo desde o começo ou realmente estou sorrindo ao saber que você está cogitando o meu suposto fingimento?"